quarta-feira, 21 de maio de 2008

O PROJETO


“ Vou me especializar numa escola generalista...”

Foi por conta de uma seqüência de eventos, em curto espaço de tempo, que me fez começar e começar a terminar este livro. Começar a terminar por que esta história ainda não acabou!
A seqüência de eventos, de sinais, teve como último sinal a fala da mãe de uma das minhas amigas, que aconteceu numa tarde destas de janeiro de 2007. Sua mãe, contou que duas pessoas de Amparo-SP fizeram um livro ilustrado e estão visitando escolas paras divulgá-lo e propor que trabalhem com ele nas escolas. Ela falou isso justamente no dia que resolvi, depois de muito me enrolar, sentar para escrever. Tenho que tomar coragem e continuar. Tenho os pensamentos, tenho muitas fotos para ilustrar o livro.Vou me expor mais uma vez., mas este parece ser o momento. A seqüência de eventos continuou... o filme “The secret” dado a mim por meu cunhado, que diz ter gostado muito. Assisti algumas vezes na mesma semana. Numa outra ‘coincidência’ naquela semana, se falou do mesmo filme num churrasco, que eu estava, por pessoas totalmente ‘desconhecidas’ por mim. Este filme tem a mesma linha do filme “Quem somos nós”. Filme este que por sua vez foi usado por mim ao longo do ano de 2006 como tema de trabalho no ensino de Biologia para o primeiro ano do Ensino Médio. Um filme também muito especial, que me fez pensar, que teve aplausos e rejeições, polêmico de alguma forma, mas muito real na minha opinião.
Bem, o parágrafo acima foi escrito no início de 2007. Hoje já é 13 de Abril de 2008. As mudanças se dão em processo... Às vezes parecem bruscas, de repente...mas é por que não enxergamos o processo. Parece que agora é uma decisão. Vai virar Livro.


VIVENDO O VIVEIRO AQUI E AGORA

“Aprendi com as primaveras a me deixar cortar para poder voltar inteira”. (Cecília Meirelles)
“Há um tempo em que é preciso abandonar as roupas usadas, que já têm a forma do nosso corpo, e esquecer os nossos caminhos, que nos levam sempre aos mesmos lugares. É o tempo da travessia: e, se não ousarmos fazê-la, teremos ficado, para sempre, à margem de nós mesmos.” (Fernando Pessoa)
Quem morre?
Morre lentamente quem não viaja, quem não lê, quem não ouve música, quem não encontra graça em si mesmo. Morre lentamente quem destrói seu amor próprio, quem não se deixa ajudar. Morre lentamente quem se transforma em escravo do hábito, repetindo todos os dias os mesmos trajetos, quem não muda de marca, não se arrisca a vestir uma nova cor ou não conversa com quem não conhece. Morre lentamente quem evita uma paixão e seu redemoinho de emoções, justamente as que resgatam o brilho dos olhos e os corações aos tropeços. Morre lentamente quem não vira a mesa quando está infeliz com o seu trabalho ou amor, quem não arrisca o certo pelo incerto para ir atrás de um sonho, quem não se permite, pelo menos uma vez na vida, fugir dos conselhos sensatos... Viva hoje! Arrisque hoje! Faça hoje! Não se deixe morrer lentamente!'' (Pablo Neruda)

Helena morou num sítio por algum tempo, mas mesmo antes ou depois de morar, sempre que esteve lá, esteve em contato com outros seres vivos...
O sítio não era muito grande, mas tinha árvores, barrancos, um grande lago, horta e um bosque nativo mais afastado, perto de onde a água era coletada do poço por bomba. Tinha também dois ou três cavalos, algumas galinhas e de vez em quando uns porquinhos.
Ela tinha uma família grande, um monte de irmãos. Quando tinha 7 ou 8 anos costumava brincar bastante lá no sítio. Às vezes, queria saber se sua ausência fazia diferença e se escondia na horta por horas (pelo menos ela sentia que eram horas) esperando que alguém fosse lá a encontrar. Isso nunca aconteceu. Não que ela se lembre. Ela sempre voltou sozinha, por ter ficado ali tempo suficiente para não querer mais ficar ali. Enquanto lá ficava seu pensamento ia longe... voava... e não parecia estar só. Praticava sua observação desde então: ouvia os pássaros, observava a plantação de alface, cenoura, brócolis, sentia o cheiro da terra, encontrava minhocas... sentia o cheiro das galinhas, do coco das galinhas, e ouvia seu cocoricó...
Acho que este contato com o ‘silêncio’ fez toda a diferença pelo resto de sua vida. Ainda hoje, que ela já cresceu, tem o hábito de ouvir o silêncio e deixar o pensamento voar... Isso lhe faz bem. Você já tentou ouvir o silêncio?

Bem, mas a história está só começando... Helena cresceu, estudou e começou a dar aulas para crianças pequenas. O que lhe marcou em sua primeira experiência de lecionar foi a possibilidade de contar histórias debaixo de uma árvore onde todas as crianças se encantavam com o lugar, conseguiam ouvir o vento, senti-lo e com certeza entravam em qualquer história. Naquela fase, Helena aprendeu que para aprender qualquer ‘coisa’, há três passos: observação, comparação e expressão. Estas etapas no caminho da aprendizagem, nunca mais foram esquecidas por ela. Algumas vezes, quando Helena tinha que chamar a atenção de algum aluno pedia-lhe que ficasse quieto e ouvisse a voz de dentro. Ouvir a voz de dentro é ouvir o próprio coração, entender as sensações, as emoções, ou no mínimo percebê-las.

A natureza, sua harmonia e diversidade sempre encantaram Helena. Ela decidiu estudar mais a fundo os seres vivos diferentes do ser Humano e foi estudar Biologia. Algumas aulas que ela teve a marcaram para sempre. Estas aulas foram aulas experimentais, práticas, onde se vivenciava a teoria e depois se relatava as sensações. Ela teve uma professora de Ecologia muito diferente. Ecologia é a ciência dentro da biologia que estuda como os seres vivos se relacionam entre si e no meio em que vivem. É o estudo da ‘casa’ dos seres vivos, pois ECO vem de oikos (grego que significa CASA). Esta professora costumava dizer que o nosso planeta é uma nave, e tem limitação de espaço e recursos. Helena também gostava muito de imaginar coisas que em ciências não se consegue ver. Em ciências também se estuda um mundo ‘invisível’. Não é por que não se vê que as coisas não estão ali. Isso foi outra coisa que ela aprendeu nesta fase. Aí ela resolveu continuar seus estudos em Bioquímica, que unia o mundo invisível com o visível. Pelo menos era o que ela esperava ou pensava ser. Na verdade este mundo bioquímico ficou invisível demais para ela. Aprendeu sobre várias coisas e especialmente muito sobre só uma coisa, se tornou uma especialista especialmente especializada. O especialista tem a capacidade de desempenhar seu trabalho bem em qualquer ambiente, pois ele fica tão concentrado no que faz que parece ‘desconectar-se’ do todo. Helena descobriu isso muito mais tarde, mas intuitivamente, nesta fase Helena já não sabia mais se queria continuar estudando o mesmo assunto tão a fundo.

Viajou. Viajou para outro continente em busca de um amor, de uma história a dois, de uma experiência diferente. Mas esta já é outra história. Viajou pois queria continuar a aprender, mas de maneira diferente. Estudou uma nova língua, trabalhou em diferentes lugares, com pessoas de várias nacionalidades. É imensurável (não dá para medir) o quanto ela aprendeu.
Algumas vezes, Helena acordava e chorava baixinho, era a dor de saudade. Lá ela entendeu o sentido real da palavra saudade. Entendeu também que toda escolha é uma perda. Pois, enquanto temos as possibilidades nas nossas mãos, estão todas ali, mas no momento em que escolhemos uma, descartamos e perdemos as outras. De alguma forma tornou-se uma pessoa melhor com suas experiências. Pelo menos é assim que ela pensa e sente. Ela pensa que aprendeu a ser mais tolerante, a respeitar a diferença, a saber ouvir e a calar quando necessário. Dizem os sábios que saber calar é um tipo de sabedoria. Talvez saber falar na hora certa também o seja.

Quando voltou ao Brasil, o que mais lhe chamou a atenção era a falta de dignidade de muitas pessoas vivendo nas ruas. Você sabe o que é dignidade? Esta é uma palavra difícil. Dignidade é ter o mínimo de condições para se viver com higiene, boa alimentação, direito à educação e saúde. Crianças abandonadas, sem futuro, sem perspectiva. Foi o que ela viu aqui no Brasil quando voltou. Isso ficou na sua cabeça...
Depois de um tempo, com a vida ‘organizada’ resolveu procurar algum grupo para trabalhar com aquelas crianças. Como é difícil e fácil ao mesmo tempo. Surgiu o primeiro sinal do viveiro!!! Os sinais apontando as direções e os caminhos que devemos seguir nem sempre são tão claros, mas Helena começou a se treinar para percebê-los. Vivendo o viveiro foi o nome dado ao projeto. Helena percebeu que a falta de condições dignas para se viver e a pobreza andavam lado a lado com a falta de educação ambiental. Mas como falar de higiene para crianças que não tem água encanada e vivem com esgoto a céu aberto? Como falar de preservar e plantar árvores se onde moram estas crianças não tem nem rua? A experiência foi gratificante, as sementes foram plantadas e o projeto saiu do papel! A troca de experiências e o aprendizado foram mútuos. Helena aprendeu que o seu ponto de vista, era o seu, mas que outras pessoas, com outras experiências poderiam discordar e nem por isso um ou outro estaria certo ou errado. Todas as ‘coisas’ têm pelo menos dois lados. Sabe como ela aprendeu isso? Por exemplo, aprendeu que o nosso jeito de falar e escrever é parte de um código formal, que muitas crianças não o reconhecem e quando falam o pássaro ‘avoa’ não devem ser corrigidas ‘diretamente’... devem saber sim que há outras formas de se comunicar. Corrigir, neste caso, é desvalorizar por completo as referências que esta criança tem. Seus pais e familiares com certeza se expressam deste modo. Helena nunca, jamais tinha pensado nisso! Será que precisamos sempre do contexto para poder ‘julgar’ o certo e o errado? Podemos julgar?! A gente é o resultado de nossa história e de nossas escolhas. Isso ela também aprendeu na prática.
O brilho nos olhos daquelas crianças, o afeto incondicional entre tantas falas gratificantes justificou o tempo e o empenho. Este ponta-pé inicial foi dado lá em Campinas – SP num bairro chamado Itatiaia. Helena conheceu pessoas muito especiais nesta experiência.
O que deu e dá cor e direção ao projeto é o pássaro BEIJA-FLOR, também chamado de COLIBRI, aquele que resplandece. Ele é um indicador ambiental, você sabia? Onde ele vive? Quantas espécies têm? Do que se alimentam? Por que é tão especial? Estas e muitas outras perguntas são feitas e respondidas neste projeto. Um fato interessante é que o pai de Helena foi um apaixonado por beija-flores e tinha uma revista em especial apontando as flores prediletas destes pássaros. Plantou várias destas flores lá no sítio, onde Helena brincava de se esconder, lembra? Passou a observá-los constantemente e fotografá-los também. Mas isso aconteceu muito tempo depois que estas flores foram plantadas. Seu pai já havia falecido quando toda esta história de beija-flores começou na sua vida. Quando Helena ia lá no sítio, pelas últimas vezes, sempre tirava um tempinho para observá-los e tentava fotografá-los. Era um exercício de ouvir o silêncio para poder ouvi-los e então visualizá-los. Seu pai, porém, de alguma forma teve e tem participação neste projeto. Parece estar presente de alguma forma. Tem alguns pensamentos que Helena tem que se lembra de seu pai. Uma fala dele que lhe é constante na cabeça é tenha sempre um objetivo. Por mais “em curto prazo” que seja, tenha um por que de fazer algo. Helena aprendeu muito tempo depois que se deve ter, pelo menos três razões para se fazer algo. Pensando assim, além de se estar motivado para levantar da cama todos os dias, eliminam-se as necessidades supérfluas, aquelas que a gente pensa que precisa, mas vive bem, muito bem sem elas. Quando o beija-flor entrou em sua vida, tudo o que lhe dizia respeito lhe chamava a atenção. Seus amigos e sua família começaram então a lhe presentear com ‘coisas’ de beija-flores. Ela tem uma coleção hoje de roupa, quadro, penduricalhos, calendário, bolsa, fotos, enfim... Parece que quem a conhece se lembra dela sempre que vê um beija-flor.

Helena mudou-se de cidade. Tinha que recomeçar mais uma vez. Por escolha, é verdade. Queria fazer daquela idéia do projeto, seu projeto de vida, seu sustento. Queria levar para o maior número de crianças possível o encantamento do beija-flor e através dele sensibilizar as pessoas para os problemas ambientais e sociais. Pensou inicialmente que poderia ser através das Universidades com projetos dentro da Educação ou da Biologia. Você sabe o que é uma Universidade? É um lugar onde as pessoas estudam e fazem pesquisas. Muita gente estuda lá depois da escola. Aqui no Brasil poderia ter mais gente estudando lá!!! Percebeu que neste meio, o meio dos especialistas especialmente especializados o projeto não cabia... Aí aconteceu mais um sinal! Devemos estar sempre atentos aos sinais.
Foi através da língua Inglesa, pois Helena aprendeu esta língua quando viajou. Começou a lecionar numa escola de educação Infantil. O Inglês foi a porta de entrada! Já na entrevista admissional Helena mencionou que tinha um projeto de educação ambiental, do viveiro, do beija-flor. Depois de um ano Helena montou um viveiro nesta escola e as aulas de viveiro, inicialmente uma oficina extracurricular, se incorporou às aulas de ciências que ela começou a lecionar também. Ao longo dos anos, Helena foi aprendendo cada vez mais sobre o equilíbrio que existe na natureza proveniente da Biodiversidade. Esta idéia estava sempre presente em suas aulas. Aprendeu e ensinou a fazer papel reciclado. Aprendeu a fazer compostagem, Fez um curso de Permacultura em 2004 e outro em 2007. Com isso aprimorou ainda mais seu olhar em relação ao essencial, ao simples, ao natural. Algumas idéias nunca mais lhe saíram da cabeça: o conforto se cria não se compra, a sustentabilidade começa em casa, os problemas devem ser resolvidos próximo da fonte geradora, somos responsáveis pelo lixo que produzimos.... Falando em lixo, desenvolveu uma parte do projeto em coleta separada do papel na escola. Este projeto envolvia e responsabilizava os alunos pela coleta separada e semanal do papel. Em todas as salas havia uma caixa, decorada por eles, para a colocação dos papéis descartados. Para a coleta, faziam rodízios entre os alunos, com uma escala feita com eles. Depois o papel era encaminhado para a coleta seletiva da cidade. Este projeto se incorporou à rotina da escola. Ficou conhecido e de alguma forma respeitado.

Quando percebeu, Helena estava vivendo sensações muito parecidas com as quais tinha vivido na infância, lá no sítio. Conseguia entre uma aula e outra ouvir o canto dos pássaros. Em casa podia ouvir o silêncio e a voz de dentro. Ela não se escondia mais horta alguma à espera de ser encontrada. Saía sim à procura das pessoas que achava que valiam a pena, que a cativavam de algum modo. Com o passar dos anos, foi plantando em casa várias flores que os beija-flores gostavam e da janela de sua casa podia ouvi-los e observá-los. Em toda a sua vida, Helena foi sempre aprendendo e nunca parou. Queria compartilhar estas sensações e sempre que podia falava de suas idéias com as pessoas.

O tempo passou e Helena resolveu encarar outro desafio! Aprender numa escola diferente sobre como se trabalhar a Educação, no seu sentido mais amplo, de outra forma. Quando realmente tomou esta decisão estava lendo um livro chamado Qual a Sua obra e lá aprendeu que devemos nos perguntar, no momento da tomada de decisão: quero, devo, posso? Estes são três verbos de ação e decisão. Procurou por um estágio na escola Da Ponte, em Portugal. Foi aceita.Começou a ler tudo que se relacionava a este lugar. Redescobriu um de seus escritores favoritos, Rubem Alves. E agora, com este estágio, pretende esboçar um plano de Educação Pós-viagem, que una o projeto do viveiro com a vivência transdisciplinar que tem e com a experiência na escola da Ponte, fazendo a ponte entre os projetos... Por que tudo que se relaciona a ela neste momento tem a ver com os preparativos da viagem, até um filme, chamado: A Ponte, ela viu na locadora sem querer e pegou para assistir. Devemos estar atentos aos sinais.

O VIVENDO O VIVEIRO AQUI E AGORA é uma idéia de um projeto itinerante, que pretende levar às crianças de vários lugares desta cidade, deste país, deste planeta um pouco de esperança, perspectivas diferentes e conscientização. É um projeto de educação Ambiental que pretende descobrir em cada lugar que passar o essencial daquele lugar, as necessidades daquele lugar e propor atividades onde as pessoas envolvidas se dêem o tempo de redescobrir o seu essencial. A construção de conceitos sobre a Biosfera, importância da água, seu ciclo. Idéias sobre saneamento básico, conceitos sobre biodiversidade, preservação, alimentação, separação do lixo, ciclos da natureza. Enfim qualquer assunto que seja de interesse da comunidade local e que seja enriquecedor para as pessoas terem mais qualidade de vida. A construção de um viveiro de flores que atraem beija-flores, assim como uma composteira e a elaboração de estratégias de coleta seletiva do lixo local fazem parte dos objetivos deste projeto. A utilização do papel como matéria–prima da reciclagem em oficinas de reciclagem de papel também devem acontecer. A convivência entre crianças de idades diferentes, a não separação por turmas ou séries, mas por áreas de interesse, deste interesse em particular que é educação Ambiental faz parte da proposta.

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